13 de março de 2011

“Eu falo ‘Vamo?’ e ela, ‘Vamo!’ ”

Texto publicado na edição 69 do Contraponto, jornal laboratório do curso de Jornalismo da Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes da PUC-SP.


Jorge e Patrícia, donos do Beleza Natural,
sinônimos do empreendedorismo emergente
brasileiro (Foto: Guilherme Amorim)
Agora, eles têm carro, GPS, aparelho de DVD, celular, conseguem cumprir com o aluguel do apartamento, estão a caminho da universidade e, o melhor de tudo, são donos do próprio negócio. Essa é a vida do casal Bispo. Jorge e Patrícia, juntos há oito anos, hoje são figuras certas em congressos de economia que discutem o mercado emergente brasileiro. Jorge e Patrícia são os exemplos do novo empreendedorismo, que pretere o valor e opta pelo volume, que não tem receio de inovar e cria tendências, que olha para a periferia com bons olhos e que sabe onde está pisando. Essa é a classe C.

É no Jardim São Luís, bairro periférico na Zona Sul da cidade de São Paulo, cuja principal via de acesso é a Estrada do M’Boi Mirim, onde Jorge e Patrícia abriram seu primeiro salão de cabeleireiros, o Cenário da Beleza. Além dos típicos tratamentos capilares, comandados pelo Jorge, no espaço de dois andares são realizados procedimentos de prevenção estética, esses sob responsabilidade da Patrícia. Mas se engana quem pensa que foi esse o primeiro negócio do casal. A história deles no mercado da beleza começa no ano de 2003.

De recepcionista, Patrícia resolveu que queria ser esteticista e foi logo atrás de um curso profissionalizante, que encontrou no Centro da Cruz Vermelha. Depois de um ano e cinco meses de aulas, ela já tinha uma nova profissão e um novo ambiente de trabalho. De repente, a vontade de ser o próprio chefe falou mais alto e ela, então, passou a procurar aparelhos usados para alugar e montar seu próprio espaço de beleza. Foi nesse período que ela encontrou no Alto da Boa Vista – bairro nobre também na Zona Sul – não só os aparelhos, bem como o espaço perfeito: uma sobreloja ampla, com cinco salas. Negócio imperdível, só faltava o dinheiro. E agora? Evangélicos que são, Jorge conta para quem quiser ouvir que foi Deus quem o ajudou a encontrar os valores adequados. O Centro Estético Beleza Natural estava criado.

O segmento da estética é rentável, a localização permitia subir os preços dos tratamentos, a clientela até que era fiel. Por que não incrementar o espaço e colocar o serviço de cabeleireiro? A vontade estava lá, mas o problema era técnico: salão de beleza precisa ficar à mostra e uma sobreloja não possibilita essa visibilidade toda. Mudar de endereço foi a única solução. Lá foi o casal de novo. E durante todo esse processo: treinamento da Patrícia, instalação do Beleza Natural, consolidação no endereço e procura de um novo espaço, o Jorge aguentou as pontas da casa trabalhando como segurança, profissão que ele começou a exercer aos vinte e um anos, logo que chegou da Bahia, e só abandonou quando foi trabalhar com a mulher.

Do primeiro centro estético em bairro nobre, para o segundo, desta vez em Moema, na mesma região de São Paulo. Eles encontraram um espaço térreo que comportava o desejo de unir o ramo da Patrícia ao ramo dos cabelos e inovar. Estava tudo negociado com o proprietário, a reforma estava em andamento, quando os planos mudaram mais uma vez. Tudo graças a uma vaidade feminina: manicure. Por esse motivo, Patrícia foi a um salão de beleza próximo à sua casa, no Jardim São Luís e, acompanhada do Jorge, ouviu da proprietária à época: “Compra esse salão de mim!”.

O que, em um primeiro momento, foi tratado como piada, começou a virar coisa séria quando pediram à proprietária para convencê-los, afinal, eles estavam prestes a inaugurar um espaço em Moema. Dito e feito. Ambos foram fisgados em seu ponto mais fraco: o filho, João Vinícius, de três anos. A relativa distância entre eles e o filho, acentuada pela rotina puxada que um salão de beleza impõe, fez com que o casal reavaliasse sua vida. O plano do salão de cabeleireiro em Moema foi deixado de lado, apenas a parte de estética seria possível, já que Patrícia teria que cuidar sozinha do negócio, enquanto Jorge passaria o final do ano no salão do Jardim São Luís para avaliar melhor.

Nessa rotina o casal se desdobrou nos meses finais de 2008: Patrícia levando os procedimentos estéticos no espaço de Moema, e Jorge colocando em prática o que aprendera em sete meses de curso de cabeleireiro. No fim do ano veio a decisão: finalmente, concretizariam o projeto do salão de cabeleireiros. Hoje, eles explicam a decisão não apenas pela influência do filho, mas pelo lado financeiro. Jorge notou que, por mais que o serviço fosse mais barato na periferia, o volume de atendimentos era muito grande e, surpreendentemente, os valores dos descontos pedidos pelos clientes do bairro nobre eram bem mais elevados. Com tanto trabalho no salão, ficou difícil conciliá-lo com Moema e eles optaram pela periferia. Juntos, resolveram encarar o “por que não?”.

Por que não tentar quebrar o tabu de que a estética só traz benefícios para a classe A e não para os moradores da periferia? Por que não beneficiar a periferia com um trabalho mais elaborado, um conforto a mais? Jorge descreve essas pessoas com a sensibilidade certeira de alguém que foi, aos poucos, substituindo a imagem do segurança durão pelo profissional atencioso. Um homem que, pela origem pobre, diz ter sofrido na vida com patrões autoritários e que tenta, hoje, proporcionar para seus funcionários o que ele e a mulher nunca receberam de seus empregadores. Uma relação próxima, mas coerente, como define o próprio Jorge.

Recuar, administrar, para então avançar. É o que Jorge define como indispensável para dar um passo adiante e ficar firme. Com a chacoalhada que ele diz ter levado quando se casou com Patrícia, hoje se vê como um homem menos conformado, e se emociona quando fala do que pode proporcionar para os filhos – ele também é pai de Ana Carolina, quatorze anos, fruto de um casamento anterior. Para os próximos cinco anos, ele cita o Day SPA que sonha em construir, e para os próximos dez, mais um espaço próprio. Viagens de avião estão nos planos a curto prazo, por mais que Jorge confesse que altura é coisa para a Patrícia e que subir, para ele, só se for na vida. Mais que qualquer exemplo de empreendedorismo, Jorge e Patrícia são exemplos de pessoas que agora sorriem.


Nota da repórter: ao Jorge e à Patrícia meu agradecimento e minha imensa torcida.

3 comentários:

  1. Gostei de ver..
    Que bom que voltou a escrever por aqui.. Já estava merecendo uma bronca de tamanho incalculável!!

    Bjos

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  2. Oi menina! Voltou,né? Otimo ve-la de novo em atividade no blog. Tambem andei escrevendo umas bobagens.Quando puder de uma olhadonha, Sou seu fã.

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  3. Nossa, voltou e voltou com tudo emm!!
    Bela reportagem, muito bem escrita e bem descrita como sempre, parabéns!
    É impressionante como vem sendo cada vez mais recorrentes esses casos de pessoas que foram bem sucedidas ao tentaram um negócio próprio.

    Ainda estamos devendo de nos encontrar lá na Confil né, hahahaha

    Beijos,
    Tomaz Civatti

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